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quinta-feira, 4 de abril de 2013

HÁ MÉTODO NESSA LOUCURA


O ditador Kim Jon-un e a suposta namorada
A maioria das notícias sobre as tensões na península coreana está eivada de simplismos maniqueístas. Como se tudo não passasse de ações tresloucadas de um ditadorzinho inexperiente, herdeiro de uma dinastia cruel e desalmada. É evidente que a dinastia Kim (pai, filho e neto), que governa a Coréia do Norte desde 1945, não é o melhor exemplo de sanidade e compostura políticas, para dizer o mínimo. Mas é preciso entender as crises entre as Coreias de um ponto de vista geopolítico. Por trás de discursos grandiloqüentes e de ameaças guerreiras há muito mais cálculo político do que supõe nossa vã filosofia política.

Incrustada entre potências como a China, Japão e Rússia, a península coreana sempre serviu como campo de batalha desses países. Os coreanos sobreviveram tentando jogar um país contra o outro e, ao mesmo tempo, manifestando subserviência, principalmente em relação aos soberanos chineses. Mas, depois de vencer a China e a Rússia, entre o final do século XIX e o início do XX, o Japão transformou a Coréia num protetorado, entre 1910 e 1945. Durante a Segunda Guerra, os coreanos foram usados pelo Japão como força de trabalho semiescrava. Na Conferência de Yalta, em fevereiro de 1945, os aliados concordaram que a Coréia integraria a futura “zona de influência” soviética, em troca do apoio de Stálin aos EUA na guerra contra o Japão. Com a derrota dos japoneses, os soviéticos ocuparam o norte da península, enquanto que o Exército dos EUA ocupou o sul. Mas os americanos decidiram, unilateralmente e sem consultar sequer os coreanos, dividir a país em torno do Paralelo 38º: a Coréia do Norte, comunista; e a Coréia do Sul, pró-americana. Esse fato, mais o advento da bipolaridade EUA-URSS e da Guerra Fria, adiariam ad infinitum a realização das eleições gerais no país, previstas para 1950.

O regime norte-coreano cultiva o mito da autossuficiência
Em 1950, o ditador norte-coreano Kim Il-Sung – que havia sido colocado no poder pelos soviéticos – mandou suas tropas invadirem a Coréia do Sul, numa tentativa de unificar o país manu militari. Então os EUA, aproveitando o boicote temporário da URSS ao Conselho de Segurança da ONU, fizeram a organização aprovar uma resolução autorizando o envio de tropas para defender a Coréia do Sul. Sob a bandeira da ONU, os EUA enviaram soldados para a península, enquanto que a China comunista engajava seus exércitos para ajudar a Coréia do Norte. A guerra terminou em 1953 em um impasse, com um armistício e a divisão do país, que sobreviveu ao colapso do bloco soviético e permanece até hoje.

A Guerra da Coréia terminou em 1953 e ficou inconclusa
Como explicar a permanência dessa divisão aparentemente anacrônica? Segundo o professor Ian Buruma, do Bard College, “a dinastia Kim se arroga o direito à legitimidade com base no Juche, a ideologia oficial do regime que enfatiza a determinação do país a se tornar autossuficiente”. Com isso, durante a Guerra Fria, Kim Il-sung tentou jogar a China contra a URSS para garantir a proteção de ambos. “Para a dinastia Kim sobreviver, a ameaça de inimigos externos é fundamental”, diz Buruma. Esse jogo acabou com o fim da URSS, em 1991. Como restou apenas a China, o regime norte-coreano ficou totalmente dependente dos humores dos governantes de Pequim.

Treinamento militar na Coréia do Sul: jogos de guerra
Assim, ainda segundo a análise de Buruma, há somente uma maneira de desviar a atenção dessa situação humilhante: “fazer propaganda da autoconfiança do país e transformar num discurso histérico uma iminente ameaça dos imperialistas americanos e seus lacaios sul-coreanos”. Os ziguezagues em relação à questão nuclear fazem parte desse jogo.

O drama, no entanto, é que uma mudança do status quo da região não interessa a nenhum dos players da região. “A China quer manter o país como um Estado-tampão e teme que milhões de refugiados fujam para o território chinês no caso de um colapso norte-coreano; os sul-coreanos jamais poderiam se permitir absorver a Coréia do Norte da mesma maneira como a Alemanha Ocidental incorporou a República Democrática da Alemanha; e nem o Japão, nem os Estados Unidos mostram-se dispostos a pagar pela limpeza depois de uma implosão norte-coreana”, diz o professor Buruma. 
           

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