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terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

CQD – COMO QUERÍAMOS DEMONSTRAR

Segundo a Forbes, o abuso de drogas caiu pela metade em Portugal dez anos depois da descriminalização. Abaixo, reproduzo o texto citado da revista e outro, este cometido por este escriba há uma década na IstoÉ online, quando as medidas de liberalização foram adotadas na terrinha.


Dez anos após a descriminalização, abuso de drogas cai pela metade

Da Forbes

Defensores da guerra contra as drogas frequentemente dizem que o uso de drogas explodiria se nós legalizássemos ou descriminalizássemos seu consumo.


Felizmente, nós temos um exemplo real dos resultados de se por fim na guerra contra as drogas e substituí-la por um sistema de tratamento para usuários e dependentes.


Dez anos atrás, Portugal descriminalizou todas as drogas. Uma década após este experimento sem precedentes, o abuso de drogas caiu pela metade:


"Especialistas em saúde de Portugal disseram na sexta que a decisão de descriminalizar o uso de drogas e tratar viciados, ao invés de puni-los, é um experimento que deu certo.


'Não há dúvidas de que o vício está em declínio em Portugal', afirmou João Goulão, presidente do Instituto de Drogas e Adicção em Drogas, em uma conferência que marca o décimo aniversário da lei.

Outros fatores também foram importantes, diz Goulão. 'Este resultado não pode ser atribuido apenas à descriminalização, mas também à confluência de tratamento e políticas de redução de danos'".

Muitas dessas políticas de tratamento não teriam surgido se os dependentes continuassem a ser presos e encarcerados ao invés de tratados por médicos especialistas e psicólogos.

E ista é uma maneira bem mais econômica e humana de resolver o problema. Ao invés de prender 10 mil indivíduos, os portugueses estão trabalhando para curar 40 mil pacientes, e fazendo pequenos ajustes no tratamento contra a dependência, ao mesmo tempo em que adquirem mais conhecimento sobre o assunto.


Drogas: um problema de repressão, cidadania ou saúde pública?

Por Cláudio Camargo, editor de Internacional


A Assembléia Nacional (Parlamento) de Portugal acaba de aprovar uma ousada legislação que descriminaliza o uso de drogas no país. Buscando substituir a punição pelo tratamento, a lei prevê que os usuários flagrados com drogas não serão mais presos pela polícia, mas encaminhados para tratamento médico. Já os consumidores que não forem dependentes terão de pagar multas entre US$ 30 e US$ 140. O autor do projeto, o deputado socialista Vitalino Canas, afirma que a nova lei cumpre uma “função social, ao mesmo tempo que deixa claro que o uso de drogas faz mal e continua proibido”.

Apesar de ser ainda discutível em termos de direitos civis – em última instância, é o cidadão quem deveria decidir o que é ruim ou bom para si próprio –, a iniciativa representa um notável avanço, principalmente num país que há apenas uma geração estava mergulhado no obscurantismo salazarista. Com isso, Portugal une-se à Espanha e à Itália no rol dos países que descriminalizaram oficialmente o uso de drogas. Ironicamente, os três são países latinos com forte tradição católica – o que supostamente os faria mais conservadores. Mas o fato de eles terem legislação mais avançada sobre o consumo de drogas deveria fazer pensar aqueles que crêem que a modernidade é um apanágio da mentalidade capitalista e protestante de Tio Sam. Pelo menos em termos de comportamento, o Grande Irmão do Norte ainda está na Idade das Trevas.

Apreensão de drogas na Colômbia

Veja-se, por exemplo, o pacote de ajuda econômica à Colômbia de US$ 1,3 bilhão aprovado recentemente pelo Congresso dos EUA. Trata-se de assistência basicamente militar para o combate ao narcotráfico naquele país, responsável por cerca de 80% das drogas consumidas pelo rico “mercado” do Norte. A mentalidade de Washington sobre o problema beira à infantilidade: já que não conseguem convencer seus cidadãos a deixar de consumir drogas, as autoridades americanas acreditam que o negócio é eliminar o narcotráfico nos países “produtores”. Quem mais sofre com essa política são os camponeses da Colômbia, da Bolívia e do Peru, que, empobrecidos, não têm outra alternativa a não ser cultivar a folha de coca, muito mais rentável do que qualquer outra cultura.


Forma-se o círculo vicioso: os EUA armam Exércitos, que montam milícias paramilitares de extrema-direita, que passam a servir aos barões da droga. Os camponeses morrem no fogo cruzado ou são obrigados a abandonar suas terras. E os lucros do narcotráfico continuam tão promissores – afinal, a demanda sobe em progressão geométrica – que vale a pena correr todos os riscos. Nos últimos dez anos, por exemplo, Tio Sam entupiu a Colômbia de dólares, assessores e equipamento militar, mas a produção de drogas não parou de crescer, assim como a espiral de violência e da violação de direitos humanos. Os cartéis de Medellín e de Cali foram desmantelados apenas para dar lugar, como cogumelos depois da chuva, a uma miríade de microcartéis cada vez mais poderosos.


Poucos duvidam que o crescente consumo de drogas no mundo seja hoje um problema dramático. Basta lembrar daquele triste espetáculo representado por jovens drogados perambulando por parques de algumas cidades europeias. Isso sem falar das nossas infames "cracolândias" – mas essa já é outra história. Por isso mesmo, querer separar as duas pontas da questão – a produção do consumo – tratando tudo como se fosse um item de “segurança nacional”, como fazem os EUA, atacando os países produtores, só faz aumentar o poder da máfia globalizada. Parece que Tio Sam se esqueceu da catástrofe que foi o período da famigerada Lei Seca (1919-1933).

Lembra-se da Lei Seca? Ela não funcionou

Dizem que nunca se bebeu tanto nos EUA – e mal, já que muitas bebidas eram falsificadas – quanto naqueles tempos sombrios da proibição. Mas o pior é que aquela estúpida legislação puritana só conseguiu fazer com que um problema de saúde pública, o alcoolismo, virasse uma questão de polícia – ou de bandidagem, já que a criminalidade deixou de ser um empreendimento amador para se tornar empresarial. Nascia o crime organizado. Incapazes de aprender com a própria história, as autoridades americanas, feito avestruzes, reproduzem agora o erro em escala ampliada - ou globalizada.


A iniciativa de Portugal de descriminalizar o consumo de drogas representa um pequeno, mas importante passo adiante na discussão do problema. Trata-se de saber se queremos tirar as drogas do âmbito da criminalidade para inscrevê-las na dupla ótica do direito dos cidadãos e da saúde pública. Como hoje são o cigarro e o álcool. Até setores conservadores como a revista britânica The Economist e o pensador ultraliberal Milton Friedman defendem, há anos, a legalização das drogas como um mal menor à hipocrisia representada pela atual situação, que não impede o crescimento do consumo, da criminalidade e da repressão inócua.


É possível que, se um dia a descriminalização se generalizar, enfrentaremos sérios problemas com o aumento do número de dependentes. Mas talvez o custo econômico e social da prevenção e do tratamento seja muito menor do que manter a proibição ao consumo, tendo de militarizar a periferia do mundo desenvolvido para combater, sem sucesso, a única beneficiária da proibição: uma máfia cada vez mais poderosa, perigosa e globalizada.

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