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segunda-feira, 16 de maio de 2011

NÃO É COM ELES...

Artigo de Paul Krugman, Nobel de Economia de 2008, revela o discurso torto da direita, que quer jogar sobre as costas dos cidadãos a responsabilidade pelo colapso econômico recente.   

"Os últimos três anos foram um desastre para a maioria das economias ocidentais. Os Estados Unidos registram desemprego em massa e de longo prazo pela primeira vez desde os anos 30. Enquanto isso, a moeda comum europeia está se desmantelando. Como é que tudo saiu tão errado?



Bem, o que tenho ouvido com frequência cada vez maior das elites econômicas - homens que se declaram sábios e costumam ser respeitados quanto pontificam a respeito do tema - é que a maior parte dos problemas aconteceu por causa do público. A ideia é a de que essa confusão surgiu porque os eleitores queriam alguma coisa sem ter de pagar por ela, e políticos desprovidos de força de vontade decidiram conquistar o eleitorado ao realizar suas vontades insensatas.


Portanto, o momento parece bom para apontar que essa interpretação de que a culpa é do público não só distorce as coisas em favor da elite como está completamente errada.

A verdade é que estamos vivendo hoje um desastre que foi criado de cima para baixo. As políticas que resultaram nos problemas que vivemos não surgiram em resposta à demanda do público. Foram, com poucas exceções, políticas defendidas por pequenos grupos de pessoas influentes - no mais das vezes, as mesmas pessoas que agora estão tentando dizer aos demais cidadãos que é preciso seriedade. E ao tentar transferir a culpa à população em geral, as elites estão fracassando em realizar uma reflexão muito necessária quanto aos erros catastróficos que cometeram.


Permitam-me concentrar minha atenção ao acontecido nos Estados Unidos, e depois comentar de passagem a situação na Europa.

Hoje em dia, os norte-americanos não param de receber sermões sobre a necessidade de reduzir o déficit orçamentário. Esse foco mesmo representa uma distorção de prioridades, porque nossa preocupação imediata deveria ser criar empregos. Mas suponha que a conversa se restrinja ao déficit, e faça a seguinte pergunta: o que aconteceu ao superávit orçamentário de que o governo federal norte-americano desfrutava em 2000?

A resposta é tripla. Primeiro, vieram os cortes de impostos de Bush, que elevaram a dívida nacional norte-americana em cerca de US$ 2 trilhões nos 10 anos passados. Depois, as guerras no Iraque e Afeganistão, que custaram cerca de US$ 1,1 trilhão em dívidas adicionais. E por fim a Grande Recessão, que resultou tanto em colapso na arrecadação tributária quanto em aumentos consideráveis nos gastos com benefícios aos desempregados e outros programas de seguro social.

Quem foi responsável por todas essas decisões que causaram estouro de orçamentos? Não foram as pessoas comuns.


O presidente George W. Bush reduziu os impostos para servir à ideologia de seu partido, e não em resposta a uma imensa demanda popular - e a maior parte dos cortes beneficiou uma minoria pequena e já afluente.

Da mesma forma, Bush escolheu invadir o Iraque porque era algo que ele e seus assessores desejavam fazer, e não por que os norte-americanos estivessem exigindo guerra contra um regime que nada teve a ver com o 11 de setembro. Na verdade, foi preciso conduzir uma campanha de vendas muito enganosa a fim de conquistar o apoio dos norte-americanos à invasão, e mesmo assim os eleitores jamais apoiaram a guerra de forma tão sólida quanto a elite política e de sabichões políticos norte-americana.


Por fim, a Grande Recessão foi causada por um sistema financeiro descontrolado, que ganhou força demais devido a uma desregulamentação imprudente. E quem foi responsável por essa desregulamentação? Pessoas poderosas em Washington, estreitamente ligadas ao setor financeiro. Permitam-me menção especial a Alan Greenspan, que desempenhou papel crucial tanto na desregulamentação financeira quanto na aprovação dos cortes de impostos de Bush - e que agora, claro, está entre aqueles que nos passam sermões quanto ao déficit.

Portanto, foi o mau juízo das elites, e não a cobiça do homem comum, que causou o déficit nos Estados Unidos. E a situação na Europa é bastante parecida.

Nem seria preciso dizer que não é isso que as autoridades econômicas europeias alegam. A história oficial na Europa hoje em dia é que os governos dos países em crise cederam mais do que deveriam às massas, prometendo demais aos eleitores enquanto arrecadavam impostos de menos. E a história, devo admitir, procede de maneira razoavelmente precisa com relação à Grécia. Mas isso não foi de modo algum o que aconteceu na Irlanda e Espanha, ambas as quais tinham dívida baixa e superávit orçamentários pouco antes da crise.

A verdadeira história da crise europeia é que os líderes do continente criaram uma moeda única, o euro, sem criar as instituições necessárias a lidar com as contrações e expansões que surgiriam na zona do euro. E o esforço por unificar a moeda europeia foi o exemplo mais claro de projeto imposto de cima para baixo, uma visão de elite imposta a eleitores fortemente relutantes.

Será que isso tudo importa? Por que deveríamos nos preocupar com os esforços para transferir aos cidadãos comuns a culpa pelas más políticas?


Uma resposta é a simples prestação de contas. As pessoas que defenderam políticas causadoras de estouros de orçamento, nos anos Bush, não deveriam ser autorizadas a agora se retratarem como parte da linha dura orçamentária; as pessoas que elogiaram a Irlanda como exemplo de gestão econômica não deveriam pregar sobre governo responsável.


Mas a resposta mais ampla, em minha opinião, é que, ao inventar sobre nossa atual situação histórias que absolvem as pessoas responsáveis por ela, estaremos perdendo a oportunidade de aprender com a crise. A culpa precisa ser atribuída a quem a merece, e nossas elites precisam arcar com os seus erros. De outra forma, causarão estrago ainda maior nos próximos anos.”

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